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Por que tantas pessoas desistem de programas de emagrecimento? O que a ciência realmente mostra

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Emagrecer e manter o peso reduzido é um desafio complexo — não um teste de “força de vontade”. A obesidade é reconhecida hoje como uma doença crônica, complexa e recidivante, que exige cuidado contínuo, individualizado e centrado na saúde, e não apenas no número da balança. Essa visão está presente em consensos e marcos recentes da EASO (European Association for the Study of Obesity). (EASO)


Além disso, estudos mostram que taxas de abandono (attrition) em intervenções para perda de peso são altas e prejudicam resultados; fatores psicológicos, comportamentais e do desenho do programa pesam mais do que características demográficas. (eurekamag.com, Europe PMC, Frontiers)


Principais barreiras (com base em evidências)

  • Expectativas irreais e impaciência

    Em serviços clínicos, muitos pacientes esperam perdas muito maiores que as consideradas clinicamente eficazes (5–10% do peso), o que favorece frustração e abandono quando a perda é “lenta” ou oscila. Estudos clássicos de Foster/Wadden e análises mais recentes ligam metas irrealistas à menor adesão. Diretrizes formais reforçam que 5–10% já traz benefícios cardiometabólicos. (Europe PMC, jandonline.org, American Heart Association Journals)

  • Dietas muito restritivas e monotonia

    Modelos hiper-restritivos tendem a ser pouco sustentáveis, piorando comportamentos alimentares e o risco de “efeito sanfona”. Revisões indicam que intervenções alimentares menos restritivas e com foco em habilidades comportamentais apresentam melhor aceitabilidade e manutenção. (SpringerLink, BMJ)

  • Falta de apoio social e profissional

    Apoio social estruturado (parceiros, grupos, equipe multiprofissional) melhora resultados e manutenção, segundo meta-análise recente no International Journal of Obesity. (Europe PMC)

  • Sabotadores emocionais (ansiedade, depressão, estresse) e “comer emocional”

    Revisões mostram associação consistente entre comer emocional e pior controle de peso, incluindo dificuldade de manutenção. Abordagens psicológicas (p.ex., técnicas de regulação emocional, TCC) são recomendadas quando esse padrão está presente. (McGill University, MDPI)

  • Ambiente obesogênico e rotina atribulada

    Vivemos em um contexto que estimula ingestão de ultraprocessados e reduz gasto energético (transporte, trabalho sedentário). A série do Lancet descreve como o sistema alimentar moderno e o ambiente local favorecem o ganho de peso — o que torna inadequado culpar o indivíduo. (The Lancet)

  • Resultados lentos e comparações sociais

    Comparar-se com outras pessoas ou com “transformações” rápidas nas redes pode corroer a motivação. Estudos em populações em tratamento mostram que comparações focadas no peso podem piorar cognições/comportamentos de controle de peso e influenciar manutenção. (Wiley Online Library, Europe PMC)


Outros fatores biologicamente e clinicamente relevantes

  • Adaptações hormonais e metabólicas à perda de peso

    Após emagrecer, há aumento de sinais orexigênicos (ex.: grelina) e redução de leptina/termogênese que persistem por meses, favorecendo reganho — um motivo fisiológico (não moral) para a dificuldade de manter o peso. Revisões e estudos clássicos do NEJM e de Kevin Hall detalham essas respostas adaptativas. (Europe PMC, hsrc.himmelfarb.gwu.edu)

  • Planejamento e autorregulação

    Intervenções bem-sucedidas compartilham componentes como metas realistas, automonitoramento e habilidades de autorregulação; maior motivação autônoma e autoeficácia mediavam melhores desfechos em revisão sistemática. (Self Determination Theory)

  • Procrastinação e perfeccionismo (“tudo ou nada”)

    A literatura sobre saúde mostra que procrastinação se associa a piores comportamentos e mais estresse, o que pode sabotar rotinas de cuidado (e dietas). (White Rose Research Online)


O papel do monitoramento: ajuda ou atrapalha?

Monitorar progresso (peso, passos, ingestão) costuma ajudar — mas nem sempre é fácil. A revisão “Ostrich Problem” descreve que pessoas podem evitar dados quando temem feedback negativo (ex.: pular pesagens após deslizes), o que mina a autorregulação. Por outro lado, ECRs mostram que auto-pesagem diária, quando bem orientada, não piora o bem-estar psicológico e se associa a melhores resultados; interrupções prolongadas da pesagem tendem a preceder reganho. (White Rose Research Online, AJP Mon Online, PLOS)


Recomendações práticas baseadas em evidências

  1. Reenquadre o objetivo: saúde em primeiro lugar. Trate obesidade como doença crônica; foque em mudanças sustentáveis com acompanhamento contínuo e personalizado. (EASO)

  2. Defina metas realistas: 5–10% de perda em 3–6 meses já melhora risco cardiometabólico; alinhar expectativas reduz frustração e abandono. (American Heart Association Journals, jandonline.org)

  3. Prefira estratégias sustentáveis a curto prazo “milagrosas”: restrições extremas e monotonia prejudicam adesão; priorize planos flexíveis, variados e com habilidades comportamentais (planejamento, repertório de refeições). (SpringerLink, BMJ)

  4. Construa rede de apoio: envolva família, grupos e profissionais (nutrição, educação física, psicologia, medicina); intervenções com apoio social têm maior eficácia. (Europe PMC)

  5. Cuide da saúde mental: rastreie e trate ansiedade/depressão; use ferramentas para comer emocional (registro de gatilhos, técnicas de regulação). (McGill University)

  6. Monitore de forma “psicologicamente segura”: se pesar com frequência pode ajudar — desde que sem punição, com foco em tendências e com suporte profissional; atenção a sinais de sofrimento. (AJP Mon Online)

  7. Planeje o mundo real: antecipe eventos, viagens e horários apertados; a falta de planejamento aumenta o risco de “escorregões”. (Baseado em mediadores de sucesso e achados de abandono.) (Self Determination Theory, eurekamag.com)

  8. Ambiente importa: reduza exposição a ultraprocessados em casa/trabalho; facilite escolhas “leptogênicas” (frutas/legumes à vista, caminhar mais). (The Lancet)


Conclusão

O fracasso não é do paciente — muitas vezes é do modelo usado. Programas que alinham expectativas, integram apoio social, consideram biologia e contexto, promovem habilidades de autorregulação e oferecem seguimento prolongado são os que, consistentemente, apresentam melhores resultados em revisões e diretrizes. Emagrecimento eficaz é personalizado, sustentável e de longo prazo. (BMJ, EASO)


Take-away para Profissionais de Saúde


  1. A obesidade é uma doença crônica complexa – não um problema de disciplina. Abordagens moralizantes ou culpabilizadoras reduzem adesão e pioram o prognóstico.

  2. Alinhe expectativas logo no início – explique que perdas de 5–10% do peso já trazem benefícios clínicos significativos. Isso reduz frustração e risco de abandono.

  3. Foque em mudanças sustentáveis – dietas muito restritivas e intervenções de “choque” aumentam o efeito sanfona. Prefira planos flexíveis, prazerosos e individualizados.

  4. Integre apoio social e multiprofissional – envolva família, grupos e equipe (nutrição, psicologia, exercício). Apoio contínuo melhora adesão a longo prazo.

  5. Avalie e trate saúde mental – ansiedade, depressão e comer emocional são barreiras reais. Encaminhe para psicoterapia ou psiquiatria quando necessário.

  6. Use monitoramento seguro – incentive automonitoramento (peso, passos, registros), mas sempre de forma psicologicamente protetora, evitando foco obsessivo em números.

  7. Considere fatores biológicos – investigue alterações hormonais e metabólicas que podem limitar o emagrecimento (hipotireoidismo, resistência à insulina, adaptações pós-perda).

  8. Adapte o plano à vida real – prepare o paciente para lidar com eventos sociais, viagens e rotina atribulada. Falta de planejamento é um dos maiores preditores de recaída.

  9. Aplique modelos de mudança comportamental – use ferramentas como o Modelo Transteórico de Prochaska para ajustar a intervenção ao estágio de motivação do paciente.

  10. Acompanhe de forma prolongada e empática – consultas regulares, revisão de metas e reforço positivo são fundamentais para reduzir abandono e promover manutenção.


Em resumo: profissionais de saúde devem atuar como facilitadores da mudança, unindo ciência, empatia e personalização. Assim, o paciente não só emagrece, mas mantém resultados com mais saúde e qualidade de vida.

Quer que eu adicione esse Take-away no final do documento Word que já preparei, para ficar completo para publicação/distribuição?


Referências (selecionadas)

  1. EASO. A new framework for the diagnosis, staging and management of obesity in adults (Nature Medicine overview). (EASO)

  2. EASO. Framework for obesity diagnosis, staging and management (2024). (EASO)

  3. Moroshko I, Brennan L, O’Brien P. Predictors of dropout in weight loss interventions: systematic review (Obesity Reviews, 2011). (eurekamag.com)

  4. Neri et al. Dropout in cognitive-behavioral treatment for overweight/obesity: systematic review (Frontiers in Nutrition, 2024). (Frontiers)

  5. Foster GD et al. Patients’ expectations & perceptions of outcomes (Obesity, 2001) + Reasonable weight loss? (1997). (Europe PMC)

  6. J Acad Nutr Diet. Unrealistic weight-loss goals and attrition (2010). (jandonline.org)

  7. Hall KD & Kahan S. Maintenance of lost weight (Med Clin North Am, 2018). (hsrc.himmelfarb.gwu.edu)

  8. Sumithran P. Long-term persistence of hormonal adaptations to weight loss (NEJM, 2011). (Europe PMC)

  9. Frayn & Knäuper. Emotional eating and weight (2017 Review). (McGill University)

  10. MDPI Review. Emotional eating, obesity e depressão/ansiedade (2023). (MDPI)

  11. Swinburn et al. The global obesity pandemic: shaped by environments (Lancet Series, 2011). (The Lancet)

  12. Thilsing et al. Social-support-based weight-loss interventions: meta-analysis (Int J Obes, 2024). (Europe PMC)

  13. Current Obesity Reports. Restrictive vs non-restrictive dietary interventions (2021). (SpringerLink)

  14. BMJ 2022. Weight-management in atenção primária: revisão sistemática (eficácia comportamental). (BMJ)

  15. Webb, Chang & Benn. The Ostrich Problem (2013). (White Rose Research Online)

  16. Steinberg et al. Daily self-weighing & psychological outcomes: RCT (AJPM, 2014). (AJP Mon Online)

  17. PLOS ONE 2014. Quebras na auto-pesagem e ganho de peso. (PLOS)

  18. Teixeira et al. Mediadores psicológicos do sucesso (BMC Medicine, 2015). (Self Determination Theory)

  19. AHA/ACC/TOS. Diretriz de manejo do excesso de peso e obesidade em adultos (2013). (American Heart Association Journals)

  20. Social comparisons & peso (Obesity, 2017; estudo prospectivo). (Wiley Online Library, Europe PMC)



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